sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Exploração sexual muda de perfil

Você pode não vê-las mais com a mesma frequência em esquinas e ruas da cidade, mas esteja certo: a exploração sexual de meninas e adolescentes ainda é uma prática comum em todo o Rio Grande do Norte. Em Natal, a assistente social Lidiane dos Anjos Sales coordena o Centro de Referência Especializado de Assistência Social da Zona Sul (Creas 1) e define o novo perfil desse crime: ocorre cada vez mais em espaços fechados e mantém uma relação direta com o consumo de drogas.
leonado soares/aeExploração hoje mantém uma relação direta com as drogasExploração hoje mantém uma relação direta com as drogas
“Somente este ano o nosso Creas já encaminhou 47 meninas e adolescentes encontradas em situação de exploração sexual e o índice de drogas é muito alto”, revela. Ela considera que o número de pontos vulneráveis à exploracão sexual de menores divulgado esta semana em um levantamento da Polícia Rodoviária Federal e Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, 110 em todo o Rio Grande do Norte, não representa necessariamente um retrocesso no combate a esse tipo de crime.

“Exploração sexual de crianças e adolescentes foi algo que sempre   existiu, mas hoje em dia é mais visível, porque não se aceita mais como algo normal e as pessoas vêm denunciando cada vez mais”, ressalta. E as denúncias (que podem ser feitas diretamente pelo Disque 100) são fundamentais, uma vez que em boa parte dos casos as famílias desconhecem a atividade na qual as jovens estão inseridas.

De acordo com Lidiane dos Anjos, a maioria das garotas recolhidas pelo serviço de busca ativa têm entre 14 e 16 anos e entram para a rede de exploração através do aliciamento, inclusive das próprias amigas. Um forte fator de atração é o ganho fácil, uma vez que as jovens obtêm uma média de R$ 100 por programa. “E muitas realizam mais de um programa por noite”, observa a assistente social. Os clientes são brasileiros e estrangeiros e a única exigência é que tenham dinheiro.

Embora ainda haja esse tipo de “vitrine”, os locais onde as meninas são expostas deixaram de ser exclusivamente as ruas. Atualmente bares, restaurantes e até mesmo os shoppings servem de local para o aliciador “apresentar” as adolescentes aos clientes. E boa parte das meninas está envolvida com o consumo de maconha, álcool e até mesmo cocaína, em grandes quantidades, assim como já foram vítimas de abusos, dentro da família.

“O nosso trabalho é conquistar a confiança das garotas e tentar levantar a autoestima delas, geralmente em baixa”, afirma Lidiane dos Anjos, lembrando que nem sempre é fácil convencer as jovens a abrirem mão do dinheiro ganho nas ruas em prol de um futuro melhor. A principal parceria da Prefeitura de Natal nesse trabalho, atualmente, é com o projeto Vira Vida, do Sesi, que oferece atividades profissionalizantes, educacionais e paga uma bolsa de cerca de um salário mínimo a cada participante. Parte do valor é depositado em uma poupança e só liberado após a conclusão dos cursos.

Inspetor justifica números dos pontos vulneráveis

De acordo com o inspetor da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Roberto Cabral, o fato de o número de pontos vulneráveis à exploração sexual nas BRs do Rio Grande do Norte ser de 110, o mesmo divulgado em 2009, não representa falhas no combate a esse tipo de crime. Ele explicou que a quantidade é a mesma do ano passado porque desde então não foi realizado um novo levantamento no estado (um novo estudo ainda vem sendo concluído) e destacou que a identificação é de “pontos potenciais”, onde não necessariamente ocorre a exploração.

O coordenador do Centro de Apoio às Promotorias da Infância e Juventude, Sasha Alves, reforça o esclarecimento da PRF, lembrando que a identificação dos locais de potencial exploração demonstra o bom trabalho realizado por esta polícia no Rio Grande do Norte. “Em outros estados pode haver bem mais pontos e não estarem sendo identificados adequadamente”, cogita. Para o promotor, ainda assim a quantidade é preocupante e demonstra a importância do trabalho preventivo e repressivo.

Ele lembra que recentemente o Ministério Público, com apoio da PRF, desbaratou uma quadrilha que praticava aliciamento de mulheres potiguares, parte delas adolescentes, e as ofereciam para programas sexuais com clientes do estado e de todo o Brasil. A operação recebeu o nome de Arcanjo. “É preciso um trabalho de inteligência, como foi desenvolvido para essa operação, no sentido de identificar e combater essas redes de exploração”, defende.

Além disso, Sasha Alves considera fundamental uma rede de proteção às jovens, que reúna desde a ação conjunta de políticas sociais, como o estímulo à educação, profissionalização e geração de renda, bem como uma melhor estrutura de conselhos tutelares e outros órgãos de acolhimentos das jovens. “Até mesmo para se aproximar das famílias e detectar o problema é preciso ter gente qualificada, porque muitas vezes os pais não sabem e ninguém fala nada.”

O promotor também aponta a necessidade de o poder público oferecer opções às vítimas desse crime. “O que a gente vai propor no lugar dessa renda que ela tinha com os programas?”, questiona.  

Famílias precisam de atenção

O esforço para tirar as adolescentes da situação de exploração sexual não se limita ao acolhimento da própria garota. A diretora do Departamento de Proteção Social Especial da Semtas, Verônica Dantas, explica que as famílias também precisam ser acompanhadas. “O trabalho anteriormente era feito pelo programa Sentinela, mas por determinação do Suas (Sistema Único de Assistência Social) passou a ficar a cargo dos Creas, que são quatro na cidade”, explica.

Quando a jovem é identificada em situação de exploração sexual, as equipes dos Creas buscam todas as informações sobre os parentes da garota e passam a fazer um acompanhamento direto da família, através de palestras de conscientização, oferta de cursos profissionalizantes e até mesmo a cobrança quanto às responsabilidades destes pais em relação às filhas. As meninas passam a ter atendimento psicossocial e, quando necessário, são encaminhadas ao atendimento de saúde e a programas como o Vira Vida, do Sesi.

Verônica Dantas revela que os pontos onde há maior incidência de casos de exploração em Natal são Ponta Negra, as demais praias urbanas e mesmo a zona Norte, próximo à Estrada da Redinha. “As meninas, conforme o caso, podem ser encaminhadas também ao Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), uma vez que a exploração sexual é considerada uma espécie de trabalho infantil”, esclarece.

A diretora aponta ainda que é comum o problema se intensificar no final do ano, quando muitas famílias do interior vêm a Natal e também pela presença mais intensa de turistas na cidade. “Ao identificarmos os casos, informamos também à Delegacia da Criança e Adolescente e à Vara da Infância”, diz Verônica. O promotor Sasha Alves, contudo, vê mais um problema nessa estrutura. “Temos uma única delegacia, em Natal, para atender todo o Rio Grande do Norte”, critica.

Fonte: Tribunadonorte

Nenhum comentário:

Postar um comentário