quinta-feira, 29 de setembro de 2011

MP aceita que polícia deixe presos algemados a grades

O Ministério Público  do Rio Grande do Norte recomendou à Polícia Civil que entregue a custódia dos presos capturados às unidades prisionais do Estado, mesmo havendo superlotação e recusa por parte dos responsáveis pelos centros de detenções. Na recomendação publicada ontem (29)  no  Diário Oficial do Estado, o promotor Wendell Beetoven Ribeiro  é claro em sua orientação. "O policial civil condutor deverá algemar o preso junto às grades ou outro ponto fixo do interior do estabelecimento indicado na ordem judicial - com algemas descartáveis (tipo abraçadeira, confeccionadas em material sintético) - e advertir o agente penitenciário presente de que, a partir daquele momento, o conduzido estará sob a responsabilidade da COAPE/SEJUC", diz o documento.

júnior santosO sistema carcerário do Rio Grande do Norte tem hoje um deficit de quase 4 mil vagas: 5.700 presos para pouco mais de 2 mil vagas. Superlotação é maior nos Centros de Detenção Provisórias (CDPs)
 A recomendação da Promotoria de Investigações Criminais está provocando opiniões contrárias.  O presidente da comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), José Maria Bezerra julgou como impensada a proposição do MP. O advogado avalia que a recomendação fere o que propõe a Declaração Universal dos Direitos Humanos,  que garante a integridade do detento e impede que seja colocado em situação precária.

Segundo o advogado, o fato de na recomendação do MP sugerir que o  gestor penitenciário da unidade seja autuado mediante um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) por desobediência judicial, acaba punindo "apenas a ponta mais frágil do sistema. A recomendação possui apenas caráter punitivo e em nada resolve  o destino, a vida dos apenados", analisa.

A fuga de nove presos em Alcaçuz, ocorrida na última quarta-feira, foi lembrada pelo advogado e apontada como  uma resposta ao descumprimento das autoridades governamentais ao antigo pleito de diversos segmentos por novas vagas no sistema prisional potiguar. "Essa recomendação resolve um problema aparente, dá uma satisfação,  e mostra que a polícia apresenta resultados. Mas ela não  preserva o mínimo do que diz os princípios que norteiam os direitos humanos", arrematou.

SUPERLOTAÇÃO

O sistema carcerário do Rio Grande do Norte está superlotado. Hoje, seriam necessários pelo menos 4 mil vagas novas vagas para atender como devido a todos que estão no sistema, segundo dados do  Coordenador de Administração Penitenciária (Coape), José Olímpio.   Em todo o RN existem 5.767 presos, ao passo que 2.085 vagas são disponibilizadas pelo setor. O problema é mais grave ainda nos Centros de Detenções Provisórias (CDPs) e nas delegacias de plantão, onde é possível encontrar uma população carcerária quase dez vezes maior que a projetada. Uma exemplo é a Delegacia de Plantão Zona Sul, em Cidade da Esperança, que tem uma única cela com capacidade para oito presos e ontem no início da tarde estava com 67 pessoas detidas. Muitos desse ficam em um solário improvisado como uma cela, sem as mínimas condições de higiene. Foi nessa unidade que só este ano a reportagem da TRIBUNA DO NORTE já flagrou por duas oportunidades presos algemados a motocicletas.

O Sindicato de Agentes Penitenciários do RN (Sindasp-RN) também descorda do que foi proposto pelo promotor e vai decidir se entram com ação judicial para inibir qualquer tipo de penalização sofrida pelos agentes. "Queria entender o porquê de o Promotor ter feito essa citação aos diretores das unidades e não fez isso com o Governo do Estado diretamente, porque é a administração estadual quem define e provê os recursos para que as vagas sejam disponibilizadas com construção de presídio", disparou Vilma Batista, vice-presidente do Sindasp.

O  Coordenador da Coape, José Olímpio Olímpio, afirmou que, mesmo com a a recomendação do MP, caso não seja possível receber o preso devido as condições a unidade, não terá como fazê-lo.

Bate-papo: Wendell Beetoven » promotor

O Promotor Wendell Beetoven conversou com a TRIBUNA DO NORTE e esclareceu as razões de sua recomendação.

Promotor, qual razão determinou essa recomendação?

O problema de custodiar presos não é da polícia Civil. A responsabilidade é da Sejuc, que está sendo omissa nessa atribuição. Acontece que os policiais civis acabam sendo prejudicados e a população também uma vez que eles não podem continuar as investigações e o atendimento ao público tenso sobre si a responsabilidade de cuidar de presos, como é visto nas delegacias de plantão.

O que então, a Sejuc deveria fazer para solucionar essa questão.

Eu sei, mas não vou dizer porque essa é a responsabilidade deles. É a Sejuc e Coape que têm a função de administrar o sistema prisional. A Sejuc está escolhendo os presos que vai receber. É como você ter uma casa para sustentar e escolher pagar somente a conta de água num mês e deixar a de luz para o seguinte. O problema tem que ser resolvido por completo.

E sobre essas possíveis sanções contra que são apresentadas na recomendação ?

A decisão tomada pelo juiz deve ser obedecida. Caso não haja concordância entre o que determina o Judiciário e o que avalia a Sejuc ou Coape instâncias como Corregedoria e Tribunais estão disponíveis para um entendimento.

Polícia Civil tem cinco mil mandados
A Delegacia de Capturas (Decap) da polícia Civil possui 5 mil mandados de prisão, referentes aos anos de 2010 e 2011, a maioria deles renovados pelos juízes de Execução Penal e relacionados aos crimes de furto e roubo.  Todos os procedimentos são oriundos das comarcas  do Rio Grande do Norte e, mensalmente,  cerca de 30 prisões são realizadas. Para debelar o ativo, a delegacia conta com 19 agentes, dois escrivães e um delegado, os quais seguem critérios para priorizar investigações e prisões, revelou o titular da Decap,  José Augusto Nunes.

Dentre as prioridades estão os mandados mais recentes e aqueles em desfavor de acusados de crimes de maior poder ofensivo, como homicidas, estupradores e assaltantes. Aliados  a esses tipos de crime, se juntam aquelas determinações judicias contra devedores de pensão alimentícia, sendo esse tipo de intervenção considerada a mais simples pelo delegado, pois os acusados geralmente possuem endereço fixo.

Sobre o efetivo para dar cabo aos  mandados, José Augusto contou que este ano o trabalho ficou ainda mais problemático, pois oito policiais foram remanejados para outras unidades. "Sabemos que o número de mandados é grande, mas estamos trabalhando de acordo com nossas condições", justificou ele lembrando que somente na última quinta-feira (22) 51 novos documentos foram remetidos a Decap. Sobre a celeridade no cumprimento das determinações judiciais, ele explicou que não se trata somente de ir a um possível endereço e prender o acusado. Na maioria dos casos, se requer investigação, uma  exaustiva busca por aquele que é citado.

O delegado aposentado Maurílio Pinto, titular da Decap durante décadas contribuiu com a informação de que o quantitativo que a priori assusta deve ser considerado à luz da existência de acusados que possuem mais de um mandado em seu nome. "Tem o caso também dos que estão presos em outros estados e com nome falso, tem os mortos. Esse número não é tão alto não. A média nos outros estados de mesmo porte é esse ou mais", disse ele. Maurílio também lembrou que há predominância nos casos relativos a furto e roubos. Sobre a data de entrada dos documentos, ele explicou que são de 2010 e 2011, a maioria deles renovada pelos juízes das varas criminais.
 
Tribuna do Norte

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